17 de março de 2021 - Atualizado: 17 mar 2021 às 17:14
Uma investigação iniciada no dia 13 de março levou Julian Reichelt, editor-chefe do maior Jornal da Alemanha Bild, a pedir seu afastamento até que se chegue a uma conclusão sobre as acusações.
A revista semanal Der Spiegel foi a primeira a noticiar a investigação sobre Reichelt. A natureza das acusações permanece obscura, mas a revista relatou que ele havia sido acusado por algumas funcionárias, incluindo jornalistas, de “abuso de poder”, “exploração de relações de dependência”, coerção e intimidação.
O Die Zeit afirmou que pelo menos algumas das acusações envolviam “má conduta com mulheres” e que Reichelt teria “favorecido funcionárias com as quais tinha relações íntimas, apenas para abandoná-las mais tarde”.
A apuração do caso é acompanhada com muito interesse porque o Bild é controlado pelo grupo de mídia Axel Springer, com mais de 16 mil funcionários em mais de 40 países. Com capital aberto, o grupo é dono de marcas internacionais como o site de notícias financeiras Business Insider, o site de análises econômicas eMarketer e o site Politico.eu, que cobre a política da Europa. Isso além de marcas líderes nacionais, como Die Welt e Die Dame, na Alemanha, e Fakt, o jornal mais lido da Polônia.
Em uma mensagem a seus colegas no fim de semana, Reichelt anunciou que sua decisão de se afastar visava a “contribuir para que a investigação possa avaliar as alegações que foram feitas”. Por enquanto, suas funções serão assumidas por Alexandra Würzbach, editora da edição dominical do Bild.
Julian Reichelt, de 40 anos, é um dos jornalistas mais proeminentes e polêmicos da Alemanha. Ele disse que as acusações são infundadas e que lutaria contra aqueles que querem destruí-lo “porque não gostam do Bild e de tudo o que defendemos”.
O Bild é um tablóide de direita com circulação diária de cerca de 1,2 milhão de exemplares, mas que já chegou a ter mais de 5 milhões na década de 1980. É o tabloide mais vendido não só na Alemanha como na Europa, acima do britânico The Sun, com cujo estilo é comparado. Tem cerca de 25 milhões de leitores por mês em seu site. Veículos concorrentes criticam os padrões do Bild e o acusam de estar empurrando a Alemanha ainda mais para a direita.
Reichelt, que comandava a edição digital do jornal, assumiu como editor-chefe em 2018 e tem adotado uma linha crítica a Angela Merkel, anti-Putin e pró-Israel. Em abril do ano passado ele publicou um editorial intitulado “O que a China nos deve”, acusando o governo do líder chinês Xi Jinping de práticas contra os direitos humanos.
Depois que a embaixada chinesa na Alemanha disse que o editorial teria provocado “preconceito e hostilidade contra a China”, Reichelt respondeu dizendo que Jinping pretendia fortalecer a China por meio de uma praga que seu país tinha exportado.Desde o início, a tendência editorial foi conservadora e nacionalista.
A Axel Springer informou que a investigação será conduzida por auditores externos, com o objetivo de fazer “uma distinção completa entre rumores, pistas e provas”.
Embora afirme não haver evidências claras contra Reichelt, em comunicado assinado por Edda Fels, vice-presidente de Comunicação Corporativa da Axel Springer, o grupo admite que há indícios concretos para a abertura de uma investigação fornecidos pelas pessoas envolvidas:
“Por princípio, a Axel Springer sempre deve distinguir entre rumores, indicações e evidências claras. Quando os boatos se transformam em indícios concretos, a empresa inicia imediatamente – como no caso recente – o processo de investigação. Quando os indícios tornam-se evidências claras, a Diretoria Executiva entra em ação. Atualmente, não há nenhuma evidência clara. Preconceitos baseados em rumores são inaceitáveis para a cultura corporativa da Axel Springer.”
Fundado em 1946 pelo jornalista Axel Springer, o grupo que leva seu nome está completando 75 anos. O Bild, criado por Springer em 1952, foi decisivo para a criação de seu império jornalístico. Isso lhe permitiu no ano seguinte comprar o Welt e sua edição dominical Welt am Sonntag no ano seguinte. Em 1956, a edição dominical do Bild também passou a circular. Essas são as capas das primeiras edições do Bild em seu formato diário e dominical:
O Bild nasceu com uma linha nacionalista e conservadora, centrada em imagens (daí o nome Bild, palavra alemã para imagem). A inspiração de Springer foram os tabloides britânicos, misturando fofocas de celebridades, histórias de crimes e tiradas políticas.
A logomarca também segue o modelo “red top”, a marca vermelha no topo que identifica os tabloides ingleses. O Bild logo se tornaria o tabloide mais vendido não apenas na Alemanha, mas em toda a Europa. Durante a maior parte de sua história, o jornal foi baseado em Hamburgo, mas mudou sua sede para Berlim em março de 2008, por considerar uma base mais adequada a um jornal nacional.
Springer faleceu em 1985, e sua viúva, Friede, ainda detém 22,5% das ações do grupo. Em 2019, a empresa norte-americana de private equity KKR tornou-se majoritária, com 35,8% de participação. O CEO Mathias Döpfner também é um importante acionista do Axel Springer, com 21,9% de participação.
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